segunda-feira, 14 de maio de 2012

Currículo e transição dificultam 1º ano do ensino médio

Alto índice de retenção é atribuído à dificuldade de adaptação a conteúdo mais extenso e à mudança de comportamento nessa fase da adolescência

O estudante João Pedro Borges Santos tem 15 anos e nunca teve grandes dificuldades na escola. Mas a chegada ao ensino médio cobrou-lhe uma atenção redobrada para manter o desempenho. "É bem diferente, na questão de avaliações, da cobrança." A colega Talita Novaes Moura, de 15 anos, tem sentido a mudança (e sofrido com ela). "Nunca fui de tirar dúvidas na sala, por timidez, e agora está ficando difícil acompanhar."

Os dois são alunos do 1.º ano do ensino médio, considerado o "vilão" para os estudantes. Em várias das grandes escolas particulares, como o Colégio Santa Maria, na zona sul de São Paulo - onde ambos estudam -, o índice de retenção é bastante superior aos demais anos dessa fase.

Segundo diretores e coordenadores, a explicação não é só o currículo, mas também se relaciona com mudança de comportamento dos jovens por conta da idade e da transição para uma nova fase. "No ano passado, olhava para o pessoal do ensino médio e todo mundo tinha um jeito diferente, mais unido, falando em festas, em uma nova fase", diz Talita.

No Santa Maria, por exemplo, o índice de retenção em 2011 chegou a 10% dos alunos. Para a coordenadora dessa série no colégio, Roberta Edo, a repetência não pode ser vista como atraso. "Refazer é positivo, porque a função da escola é estruturar. Se tivesse passado, não iria acompanhar o próximo período", diz ela. "As mudanças curriculares coincidem com uma mudança interna, eles querem ter liberdade e autonomia."

A estudante Laís, de 16 anos, vive isso. Está fazendo o 1.º ano pela segunda vez, depois de ter sido retida em 2011. "A gente acha que é mais independente. E não acompanhei, não me adaptei e comecei a ir mal em matéria que sempre gostei. Só depois que repeti percebi as mudanças, que preciso estudar todo dia, tirar as dúvidas", diz ela, que não quis dizer o sobrenome.

Aulas. Para Alex Tabuada, de 17 anos e aluno do Mater Dei, que também repetiu o 1.º ano, a dificuldade maior foi acompanhar as disciplinas - apesar de ter sobrenome de conteúdo matemático. "Temos muito mais matérias e, ano passado, não estudei no começo. Depois virou uma bola de neve", diz ele.

No Mater Dei, o número de retenções também cresce na entrada para o ensino médio - é quase o dobro do registrado no 2.º ano -, assim como o de alunos que trocam de escola na reta final para evitar perder o ano. "É uma grande transição. A carga horária a partir do primeiro ano do ensino médio é maior. As exatas são a grande dificuldade", diz a coordenadora, Regina Ratto. Na escola dela, o ensino médio possui nove aulas a mais que o último ano do fundamental.

Os alunos do ensino médio encontram uma mudança considerável na grade de aulas. Química, Física e Biologia ganham especificidades, além de novos conceitos em Língua Portuguesa e Literatura. E a luz vermelha do vestibular começa a aparecer.

"Normalmente, o ensino médio tem ritmo mais puxado, porque a gente tenta fazer tudo em 2 anos e meio para que haja uma espécie de cursinho nos últimos seis meses", explica a coordenadora pedagógica do Colégio Sidarta, Anna Karina Da Col. Segundo ela, é importante que a transição seja realizada de modo gradual. "Temos que envolver a família, não da para esperar o boletim", completa.

No Sidarta, o nível de retenção no 1.º ano é evitado com algumas ações, como uma recuperação paralela, um conselho no meio do trimestre para analisar casos específicos, além da aproximação dos professores do ensino médio com as séries do fundamental.

Apesar das preocupações da escola, Melanie Ho, de 14 anos, notou uma mudança. "A sala toda sentiu uma diferença em relação ao aprendizado. A responsabilidade tem de ser maior, já sabemos que precisamos de mais foco", disse.


Novo estágio cobra maturidade que muitos não têm
A cultura do ensino no Brasil convive com degraus de passagens de níveis. O ensino fundamental é mais protetor com os estudantes e o médio já espera uma maturidade maior, que eles nem sempre têm. Isso geralmente contribui para as dificuldades na entrada dessa fase.

A geração atual de adolescentes é muito mais culta no geral do que a de décadas passadas. Mas também bem mais imatura, talvez como consequência do nosso modelo social. É um paradoxo: por um lado, são jovens extremamente cultos, que discutem de igual para igual com adultos em vários assuntos, e, por outro, têm necessidade de um guia. Algo que o ensino médio nem sempre oferece.

São jovens acostumados a serem mais protegidos e que se assustam muito com a mudança estrutural de um nível para outro. Na sala de aula, tornam-se mais inquietos, brincalhões e desatentos. E ainda se acham mais independentes do que a idade permite, com a pretensão de saber todas as questões.

Há muitos estudantes nessa fase que são excelentes, mas acabam tendo dificuldades em contato com sistemas de ensino mais tradicionais. Muitas vezes, necessitam do cuidado que somente escolas mais intimistas podem proporcionar.

Às vezes, a retenção amadurece o jovem e contribui para que ele possa acompanhar melhor a escola. Contribui para que a subida do degrau seja mais suave. No entanto, depende muito de como os pais e as famílias encaram esse momento e manejam a situação. A formação passa pela família e é importante que o adolescente perceba o respeito mútuo e a seriedade que precisa assumir.

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