Encontro entre advogados, dirigentes sindicais e
educadores questiona motivos para redução da idade e defende cumprimento do
Estatuto da Criança e do Adolescente
São Paulo
- Reduzir a maioridade penal pra quê? Esse foi o questionamento mais utilizado
no debate promovido pelo Sindicato em parceria com a Fundação Projeto Travessia
nesta quarta-feira 13. O evento teve como convidados o advogado Ariel de Castro
Alves, presidente da Comissão da Infância e Juventude da OAB de São Bernardo do
Campo, e José Nildo Alves Cardoso, advogado e militante na área de Direitos
Humanos da Criança e Adolescente.
Para a
presidenta do Sindicato, Juvandia Moreira, é necessário se informar e
disseminar a informação sobre o tema, promover o debate com a sociedade, com a
família. “O Congresso Nacional tem hoje uma configuração bastante conservadora.
É bom refletir para não reproduzir informações equivocadas”, ressaltou a
dirigente na abertura do encontro.
O
advogado José Nildo explicou que discutir a redução da
maioridade penal “é como nadar contra uma maré que entra em nossa casa há 40
anos entre 17h e 19h”, referindo-se aos apresentadores sensacionalistas da
grande mídia, como o já falecido Jacinto Figueira Júnior, conhecido como o
homem do sapato branco, que introduziu o estilo “mundo cão” na televisão
brasileira, seguido por Ratinho, Datena, Marcelo Rezende entre outros.
Para José
Nildo, “a mentira defendida várias vezes vira verdade e vira discurso social”,
referindo-se ao posicionamento da maioria dos apresentadores desse tipo de
programa de TV pela redução da maioridade penal. “O argumento é emocional e não
racional. São perguntas como ‘e se fosse seu filho?’ ou ‘e se fosse com sua
família?’ feitas ao telespectador”, explicou o advogado. “Discutimos como
reprimir, não como prevenir”. Ele ressaltou que apenas casos de vítimas de
classe média e brancos é que alcançam visibilidade da imprensa.
O
advogado informou durante o debate que, em um Brasil com 21 milhões de
adolescentes, cerca de 19 mil estão internados, sendo 9.016 somente no estado
de São Paulo. No entanto, apenas 83 estão na Fundação Casa por crimes de
latrocínio. Menos que 1% por homicídio. A maior parte está internada por
tráfico. “Estou para encontrar um estudo que mostra quando a violência diminuiu
por conta da redução da maioridade penal”, conclui desafiando quem aponte um
país que tenha passado por essa situação com resultados positivos para a
sociedade.
A
Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança de 1989, da qual o Brasil é
signatário, recomenda a idade mínima de 18 anos para uma pessoa ser tratada
como adulto na esfera penal.
Prevenção - Enquanto o debate sobre o assunto está cada vez
mais efervescente no Senado (leia mais abaixo), o sistema prisional
brasileiro continua caótico. Em reportagem recente do Fantástico (TV Globo)
sobre tortura de adolescentes no complexo Vila Maria, projetada no telão do
Auditório Azul na abertura da exposição de Ariel Castro Alves, a presidenta da
Fundação Casa, Berenice Giannella, informa que o custo de cada adolescente
internado é de R$ 7 mil ao mês. José Nildo ressalta o número de crianças e
adolescentes fora da escola no país: 3,6 milhões. “O custo de uma criança no
ensino básico é de R$ 280. A prevenção é mais barata que a prisão, que são
estruturas de mini presídios”, destacou Ariel.
Para ele,
“antes de pensar em novas legislações penais, é necessária completa
reestruturação das nossas polícias e do poder judiciário, que é bastante
corporativista e racista”. O advogado destacou que o sistema prisional
brasileiro é inadequado para quem está formando sua personalidade, e que é
necessário investimento em áreas preventivas. “As denúncias ao Disque 100 de
casos de violência contra crianças e adolescentes chegam a 400 por dia”.
“Reduzir
a maioridade penal é dar um atestado de incompetência de que o Brasil não tem
capacidade de avançar na prevenção (da violência) e educação dos jovens”,
concluiu Ariel Castro.
Enquanto isso, no Senado... – Em Brasília, a semana também foi
de debate sobre a redução da pena de adolescentes. A Comissão de Constituição,
Justiça e Cidadania (CCJ) discutiu na terça-feira 12 a PEC 33/2012, que
estabelece que jovens maiores de 16 anos podem cumprir penas equivalentes às
dos adultos em crimes como tortura, terrorismo, tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins e os hediondos.
A
penalidade poderia ser imposta ainda em casos de múltiplas repetições de lesão
corporal grave ou roubo qualificado. No entanto, o maior rigor na punição só
poderia ser pedido pelo Ministério Público especializado em questões de
infância e adolescência e decidido por juízes também encarregados de cuidar de
crianças e adolescentes.
O senador
Ricardo Ferraço (PMDB-ES) apresentou o relatório sobre seis PECs em exame na
CCJ e que foram analisadas em conjunto. Ferraço pediu o arquivamento de cinco
delas e propôs a aprovação da emenda constitucional apresentada pelo senador
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP). Houve um pedido de vista coletiva para melhor
análise do texto e ainda não foi marcada a data de votação da matéria.
O
presidente da CCJ, Vital do Rego (PMDB-PB), apesar de ter ciência da polêmica
desta mudança na Constituição, disse na sessão sua vontade é decidir a matéria
ainda este ano.
A
senadora Ana Rita (PT-ES) propõe debater o cumprimento do ECA em vez de reduzir
maioridade penal. “Eu sou totalmente contra a redução da maioridade penal. Eu
penso que é preciso fazer um debate mais aprofundado sobre o Estatuto da
Criança e do Adolescente, para que ele seja, de fato, mais conhecido pela
sociedade e pelas autoridades, porque o que o Estatuto propõe em termos de
medidas com relação à criança e ao adolescente que comete algum ato infracional
não está sendo corretamente aplicada pelo Estado.”
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