O texto abaixo é de Raimundo Justino. Foi
publicado no grupo Faces da Escola, do Facebook. Num momento em que um fato e a mídia nos leva a
sermos tomados pelo sentimento, pela fúria, pelo desejo de vingança, o texto
nos leva a parar e refletir sobre a questão da redução da maioridade penal.
De maneira bastante concisa, mostra as razões pelas quais ele se
posiciona contrário à redução da maioridade penal, mas indica a leitura de um
texto um pouco mais longo que, de maneira imparcial, colocando os dois lados da
“moeda”, nos faz refletir sobre tema. O texto indicado pelo Raimundo mostra que
já existe pena para casos extremos, além dos três anos de reclusão em
instituições para reeducação de crianças e adolescentes que se envolvem em
delitos.
A VIOLÊNCIA NOSSA DE CADA DIA
Mais
uma vez a ideia da redução da maioridade penal explode na mídia. E mais uma vez
ela é exposta de forma superficial e tendenciosa.
O
caso-símbolo agora ocorreu no bairro do Belém. Um jovem de 19 anos é abordado
antes de entrar em seu condomínio, por um outro jovem - não, é um
"menor", não é um jovem.
A
vítima reage, e aqui está o primeiro nó: quase todos os jornais noticiaram que
tratara-se de uma "execução", ou seja, o rapaz abordado foi morto
MESMO entregando o celular. Isto não é verdade. Por algum motivo, seja lá qual
for, ele reagiu. Girou de um lado pra outro e o disparo é feito nesse milésimo
de segundo entre a entrega e a luta. Se não fixarmos isso não há como
começarmos um debate sério a respeito da natureza do crime.
"Ah,
então, você está justificando o que ele fez, quer dizer que não se deve reagir,
deve-se ser morto sem se defender", etc...
Essas
são frases clássicas que manipulam a discussão sobre violência, porque elas
desqualificam um argumento tentando igualá-lo ao do criminoso.
Nada
justifica um homicídio. Não admiro Gandhi e Mandela só por moda; creio
realmente que violência gera violência. E ponto.
A
morte de alguém nessas circunstâncias é dolorosa e medonha. E ponto
O
problema é que em certos períodos, a imprensa promove uma enxurrada de notícias
sobre casos "semelhantes" (não importa se há diferença entre um furto
e um homicídio qualificado) cometido por "menores". Um sentimento
"coletivo" toma conta dos telespectadores e dos ouvintes. Na
Internet, o anonimato encoraja as pessoas a sugerir atos medievais, que nem
mesmo os seriais killers mais refinados tiveram coragem de fazer.
Três
dias depois da crime no Belém, a Rádio Bandeirantes faz uma reportagem
ridícula. Descreve-se que um ladrão agira na região da Paulista e fora
imobilizado pelos transeuntes. Não se explica o que ocorreu, mas 90% da matéria
se prende em moralizar a questão: duas testemunhas comemoram o fato do ladrão
ter sido espancado até quase morrer, e a apresentadora, Silvania
Alves(salves@band.com.br), que receberá esse texto, emenda: "Não se deve
fazer justiça com as próprias mãos, MAS a população tá cansada de ver
impunidade, etc....". Datena, Bóris Casoy e Marcelo Rezende recorrem a
esse tipo de frase com frequência.
Curioso
é que o Grupo Bandeirantes, que lucra milhões por ano, promoveu o voto a favor
das armas no plebiscito há alguns anos e veicula programas da mais baixa
qualidade como Pânico, Polícia 24 horas e Mulheres Ricas...
E
esse é o segundo nó da questão, afinal, quando falamos em "mudanças de
lei", "menos impunidade" estamos nos referindo a medidas legais,
que possam de fato colaborar para uma melhora ou estamos querendo apenas uma
VINGANÇA COLETIVA? Sim, porque se espancar uma pessoa coletivamente irá aliviar
nossa revolta, qual será então, a diferença entre nós e os monstros que cometem
tais atrocidades? Se achamos que devemos colocar todos os bandidos em um
paredão e atirar como falou na frente de todos os clientes meu cabelereiro -
ele mesmo, um cara que já sofreu diversas formas de violência desde que migrou
do Ceará pra cá - qual, será, então, a diferença de nossa postura para a
de um homicida pego em flagrante?
"O
que você sugere então, Raimundo?"
Bem,
se a violência é uma doença social construída há muito tempo, obviamente a
solução também será a longo prazo. Educação, emprego, diminuição das
desigualdades, combate aos preconceitos, mudança dos parâmetros da Segurança
Pública, etc... tudo aquilo que sabemos que é certo, e não fazemos. Aliás,
VOCÊ, que defende a redução da maioridade, já esteve em algum movimento,
protesto, grupo que pense em ao menos uma das questões acima? Ou você só se
mobiliza quando a dor da morte de alguém próximo bate na sua porta, quando as
garras da violência te tocam pessoalmente e não somente pela TV? Balões
brancos, nesse caso, só não estão vazios porque carregam a profunda tristeza
que a perda de alguém nos provoca...
Mas
não fugirei da pergunta. Em casos escabrosos (não sei se esse é um), no qual há
flagrante, confissão, e indícios de alta periculosidade do criminoso, penso que
já há brechas na lei que podem ser usadas, como no caso do Champinha (segue
link de uma ótima matéria sobre o assunto - http:// revistapiaui.estadao.com.br/ edicao-56/ questoes-juridico-psiquiatricas /os-que-morrem-os-que-vivem). Reduzir a
maioridade seria mais que um erro, seria uma farsa, um pano escuro cobrindo
tudo o que é de fato gerador da violência nossa de cada dia.
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